Regional
Conheça o chocolate 100% cearense feito de cacau do Sertão
Um dos doces mais consumidos em todo o mundo é o chocolate, cuja ingestão desperta sensações de prazer e relaxamento. Para o nascimento desse produto, a principal matéria-prima utilizada é o cacau, uma planta originária da floresta tropical úmida americana, mas que, embora não seja endêmica do Brasil, passou a ser plantada em várias regiões.
Hoje, 7 de julho, é celebrado o Dia Internacional do Chocolate, também conhecido como “Chocolate Day”. A data, comemorada em todo o mundo, começa a ter ralação mais íntima com o Ceará, tradicional produtor de culturas típicas do semiárido nordestino, como banana, caju, maracujá e coco, mas que desponta com forte potencial para produção do cacau.
No Brasil, a maior parte do cacau é proveniente do Pará (52%) e Bahia (40%) – estados que lideram a produção nacional – mas, agora, o chocolate que chega à mesa – ou à boca – do cearense percorre uma distância bem menor. Se antes ele tinha que ser exportado de outros estados, hoje o cacau já pode ser plantado em solo cearense e transformado em chocolate.
A cultura do cacau, ainda que tida como exótica, começou a ser experimentada há dez anos no Vale do Jaguaribe e tem apresentado resultados animadores. A ‘Rota do Cacau’, segundo pesquisadores e agrônomos, pode ganhar no futuro o carimbo cearense.
INÍCIO DO CICLO
Em 2010, a Agência de Desenvolvimento do Estado do Ceará (Adece) através do projeto ‘Diversificação de Culturas de Clima Temperado no Ceará’ iniciou uma parceria com a União dos Agronegócios do Vale do Jaguaribe (Univale), Embrapa e com a Comissão Executiva do Plano da Lavoura Cacaueira (Ceplac).
O objetivo era identificar e avaliar alternativas agrícolas para o Ceará. O chocolate com cacau foi o escolhido para ser cultivado entre as cidades de Russas e Limoeiro do Norte, no Vale do Jaguaribe.
Segundo Sérgio Baima, analista de Atração de Investimento e Mercado da Secretaria de Desenvolvimento Econômico e Trabalho do Ceará (Sedet), a época em que fora iniciado o experimento foi justamente o período de boas chuvas no Ceará.
“O ano de 2011 choveu muito, assim como em anos anteriores, como em 2009. Isso nos fez animar e abrir os olhos para novas culturas”, relata o analista da Sedet.
A Adece destaca que o projeto tinha como principais objetivos introduzir e avaliar o potencial agronômico e econômico de espécies frutíferas de clima temperado; definir estratégias de adaptação e manejo das culturas introduzidas; viabilizar a produção de frutas e outros produtos em épocas diferenciadas das regiões tradicionalmente produtoras; e disponibilizar aos agricultores novas opções de cultivos de valor econômico para as áreas irrigadas.
BONS RESULTADOS
O cacau atendeu parte dessas expectativas. Plantado inicialmente em uma área de três hectares em Russas e um hectare em Limoeiro do Norte, o cultivo se mostrou promissor. Ao longo desta última década, produtores observaram que o cacau plantado no semiárido cearense teve produtividade média anual cerca de dez vezes superior à registrada na Bahia.
Além disso, neste período, não foi identificada nenhuma praga que afetasse o pomar. Fatores que abrem caminho para expansão da produção do cacau em solo cearense.
Sérgio Baima, reconhece os pontos positivos da cacauicultura, mas pondera que ainda há “pontos a serem analisados” antes da expansão da área plantada no Ceará.
“É uma cultura que se mostrou promissora. Mas os testes têm que seguir para que os produtores encontrem a equação perfeita entre custo e produtividade. Em sumo, diria que estamos meio caminho andado”, avalia.
A produção em outros estados têm grandes problemas devido à vassoura-de-bruxa, causada por fungo e uma das doenças com maior impacto econômico na produção de cacau. O Ceará está naturalmente isento da doença em razão do clima semiárido. SÉRGIO BAIMA, Analista de Atração de Investimento e Mercado da Sedet
ESTRATÉGIAS ADOTADAS
O engenheiro agrônomo e doutor em Manejo de Solo e Água, Diógenes Abrantes, revela que para alcançar estes resultados, técnicas especificas foram adotadas. Ele é o técnico responsável pelo experimento da produção de cacau no Ceará.
A irrigação difere da usualmente utilizada no Pará e Bahia – onde quase todo o cacau é de sequeiro. Aqui, explica Diógenes, fora utilizada o sistema por meio de gotejamento e micro aspersão. Essa técnica já é utilizada, com êxito, em outras culturas, como o trigo.
O especialista acrescenta ainda que as pesquisas foram muito além do simples plantio do fruto. Foram observados o sistema de produção, sombreamento, clones, fertiirrigação, manejo e tratos culturais, condução do pomar, colheita e tratamento pós-colheita das amêndoas, além de material genético melhorado.
Muitas informações sobre comportamento do cacaueiro irrigado já foram obtidas, com destaque para a precocidade de alguns clones, a necessidade de conforto térmico através de sombreamento, os riscos de salinização da folhagem e a importância de manter as plantas com boa nutrição e sem stress hídrico. DIÓGENES ABRANTES, Engenheiro agrônomo e doutor em Manejo de Solo e Água
Esse leque de abragência foi o fio condutor do experimento. “Iniciamos com 12 clones de cacaueiro. Ao longo do projeto, identificamos os que mais se destacaram. Após oito anos, plantamos cinco deles em outra área, na Chapada do Apodi, em Quixeré, juntamente com seis clones trazidos da Bahia”, explica o agrônomo.
Já na primeira fase do experimento, produtores e técnicos conseguiram extrair bons resultados.
A primeira colheita foi feita apenas dois anos após o plantio, por se tratar de uma produção irrigada. Em um cultivo tradicional, o cacaueiro começaria a dar frutos em 4 a 5 anos. A produtividade foi em torno de 3 mil kg de amêndoa por hectare/ano, valor maior que a produção média da Bahia, que chega a 350 kg hectare/ano. SÉRGIO BAIMA, Analista de Atração de Investimento e Mercado da Sedet
Hoje essa área mais que triplicou, tendo cerca de 15 hectares plantados no Vale do Jaguaribe. “Essa é mais uma fase do experimento. Com os clones selecionados, e com a expertise adquirida ao longo do experimento, como conhecimento nutricional e tempo certo de poda, vamos avaliar como eles [clones] se comportam”, detalha Diógenes.
Dentre os 15 hectares em Tabuleiro do Norte, cerca de 8 estão na fazenda de propriedade de João Teixeira Júnior, presidente da União dos Agronegócios no Vale do Jaguaribe (Univale). Ele, assim como Sérgio Baima, comemora os resultados, mas prega cautela, apesar do avanço na área de plantio.
“Ainda é uma área muito pequena. Realmente feita para testarmos a cultura, quais tecnologias [de irrigação] são mais adequadas, qual a lucratividade e etc. Tenho, porém, segurança de que é uma cultura que pode dar muito certo no Ceará, mas é preciso avançar nos estudos”, considera.
No Ceará, além de utilizar-se de dois sistemas de irrigação, o de gotejamento e microaspersão, os produtores utilizando a técnica de sombreamento, com predominância da bananeira, cajazeira e coqueiro.
“Esta é outra razão que explica a lentidão dos experimentos. Para estas culturas crescerem, leva-se um tempo. Além disso, é preciso avaliar também o custo operacional dessas culturas secundárias, que darão o sombreamento ao cacau para identificar a lucratividade do negócio”, destaca Baima.
RENTABILIDADE DA CULTURA
Para Teixeira, há viabilidade econômica. Inclusive, parte do produto colhido em sua propriedade já foi escoada ao estado da Bahia. O presidente da Univale antecipa que a próxima etapa do projeto é definir áreas maiores de irrigação no Estado que possam expandir a produção do cacau.
O ponto baixo do experimento foram os baixos volumes de chuvas observados nos últimos anos nas regiões que acolhem o experimento. Essa redução de água disponível para irrigação acarretou no recuo de empresas que estavam se preparando para investir na cultura.
A falta de água, no entanto, não é tida por Diógenes Abrantes, como um limitador da cultura. Ele aponta que o cacau carece de menos água que outras culturas, como o maracujá, através de estudos é possível desenvolver cultivares de cacaueiro resistentes à seca e com alta produtividade. Para tal, contudo, é necessário aporte financeiro.
“Para investir no gotejamento e fugir da dependência total da chuva, o empresário precisar investir um maior montante em insumos e tecnologias e, para isso acontecer, ele precisa ter segurança na rentabilidade da cultura. Por isso seguir com os testes é tão importante”, conclui João Teixeira.
Segundo João Teixeira Júnior, regiões com a Ibiapina, Cariri, Litoral Oeste e Vale do Jaguaribe se mostram viáveis [para a cultura]. Com uma política de recursos hídricos para viabilizar a produção em maior escala poderemos atrair grandes empresas interessadas no produto”.
Na atual etapa do projeto experimental, a Adece e a Secretaria do Desenvolvimento do Estado do Ceará (Sedet), darão suporte aos produtores. Segundo o secretário executivo do Agronegócio da Secretaria do Desenvolvimento Econômico e Trabalho (Sedet), Sílvio Carlos Ribeiro, as pastas “entrarão na fase de acompanhamento técnico e expansão destas culturas alternativas, visando atrair investidores e gerar mais emprego”.
Fonte: Diário do Nordeste
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