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Entre Olhares: Violência e capital simbólicos

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Neste artigo me inspirei no sociólogo francês Pierre Bourdieu, nascido em 1930 que faleceu em 2002 (SCOTT, 2009), tendo sido o primeiro a levantar a questão da violência simbólica dentro da sociedade e classificá-la como um fenômeno social a ser estudado e compreendido pelas Ciências Sociais. Seguindo a sua trilha Salvini (2012) lançou uma explicação inteligível a respeito do assunto e que de maneira descomplicada faz-nos entender melhor este tema.

Para Salvini (2012) a violência simbólica é exercida através da cumplicidade entre suas vítimas e seus executores, considerando que ambos não têm consciência do que está acontecendo. Trata-se então de um fenômeno social disfarçado, invisível e esquecido. Ele exerce a função de legitimar um discurso, uma decisão, as práticas de um agente público ou uma instituição. As relações de forças não são claras e nem conhecidas.

Salvini (2012) afirma que a violência simbólica tem a função de reprimir arbitrariedades, Contudo, contraditoriamente, o que ela acaba fazendo é justamente reforçar as arbitrariedades. Trata-se de uma parede sem portas, uma prisão invisível. É, literalmente, uma violência mascarada, disfarçada. Para ilustrar ainda mais e reforçar o entendimento, recorri ao trabalho de Goldenberg (2007), intitulado O CORPO COMO CAPITAL, que também se inspira no francês Bourdieu.

Goldenberg (2007) chama à atenção acerca da violência simbólica social que é perpetrada contra as mulheres, impondo-lhes padrão comportamental e de beleza, que unanimemente são aceitos tanto pelos homens e, o que é estarrecedor, pelas mulheres. O caso mais emblemático de violência simbólica feminina ficou estampado na grande imprensa nacional e que foi motivo de escárnio nas redes sociais, a famosa reportagem intitulada BELA, RECATADA E DO LAR.

O Brasil iniciou o Século XXI detentor da primeira colocação do mundo em realização de cirurgias plásticas, onde 70% das mulheres, com 15% menores de 18 anos, remodelaram alguma parte de seus corpos: 54% lipoaspiração; 32% mama; 27% rosto; 16% pálpebras; 11% nariz. Numa década, o implante de próteses de silicone cresceu 360% no nosso país. As cirurgias plásticas para remodelar seios entre as adolescentes cresceram 300% em dez anos.

As principais justificativas para fazer uma cirurgia plástica são: atenuar os efeitos da velhice, corrigir defeitos físicos e esculpir um corpo perfeito. No ano de 2002 a artista CARLA PEREZ ocupou grande espaço na mídia nacional e internacional com a seguinte manchete: “De cara nova: com operações mais baratas, alternativas de conserto para quase tudo e grandes médicos em atividade, o Brasil passa a ser o primeiro do mundo em cirurgia plástica”.

Hoje e mais próximo de nossa realidade nordestina temos a emblemática SOLANGE que decolou nas plataformas de sucesso através da Banda AVIÕES DO FORRÓ. Pesquisa feita pela Dover & Unilever constatou que 89% das brasileiras querem mudar algo em seus corpos; 7 em cada grupo de 10 deixam de fazer alguma atividade (trabalhar, ir à praia/piscina, frequentar bailes/festas) quando se sentem feias ou gordas. Somente 2% das gordinhas se acham sexy ou bonitas.

Pelo menos em alguma coisa o Brasil passa à frente dos Estados Unidos: 58% das brasileiras afirmam que se a cirurgia plástica fosse gratuita, não exitariam em recorrer ao bisturi. Mesmo tendo renda 14 vezes menor do que as americanas, as brasileiras colocam o Brasil em destaque no ranking. No meio infantil, 9 em cada 10 meninas querem ser modelo. Provavelmente por que a modelo mais bem paga do mundo que figurou dentre as 20 mais ricas do planeta, foi Gisele Bündchen.

A ONU constatou que o Brasil detém o maior consumo mundial per capta de remédios para emagrecer, líder no consumo de moderador de apetite. Aqui o consumo diário desses inibidores é de 12,5 por mil habitantes. Nos EUA, apenas 4,8. São comuns casos de overdose que podem levar a ataques de pânico, agressividade, alucinações, convulsões, problemas respiratórios, coma e morte. Ou seja, vivemos uma situação de DEPENDÊNCIA SIMBÓLICA: sua existência é primeiro “pelo e para” o olhar dos outros.

Na sociedade brasileira as relações HOMEM x MULHER são permeadas por diferenças biológicas que são enaltecidas para justificar as diferenças sociais (SALVINI, 2012). Faz-se o uso social do corpo para distinguir os sexos, padronizar condutas, estabelecer o que é aceito e desejável: No caso da mulher, a delicadeza do seu corpo, os gestos e a submissão dos seus atos. Por sua vez, o homem, através da prática esportiva de contato (em especial o futebol) validam e reafirmam a sua masculinidade e virilidade.

Quero aqui reafirmar o pensamento do Sociólogo francês Pierre Bourdieu (1983) “dadas as relações sociais de desigualdade entre os sexos serem desconhecidas ou mascaradas, as mulheres se submetem às regras que definem o que deve ser o seu corpo, não só na sua configuração visível, mas também nas suas atitudes e na sua apresentação”.

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