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AMERICANDO: O deslumbramento da arraia miúda – plebe

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Parte I

“Quando a educação não é libertadora, o sonho do oprimido é ser o opressor.”
(Paulo Freire, Pedagogia do Oprimido, 1968)

Não é de hoje que um dos maiores desejos de boa parte dos oprimidos é se tornar opressor. É ser algoz dos seus semelhantes de classe econômica, simplesmente e infelizmente. Digo infelizmente, porque o tal “vencer na vida” deveria ser um direito natural em uma sociedade tecnologicamente desenvolvida, mas percebemos que quanto mais desenvolvimento, mais miséria paradoxalmente em ação. Monopoliza-se o lucro e socializa-se a miséria…

Conheço um cidadão oriundo da zona rural, aliás, ele é um estereótipo em semelhança de muitos em nosso país. Mãe e pai são agricultores, estudante de escola pública, família de classe econômica baixa, pertencente a um povo historicamente exterminado. Ele é religioso, além de outras peculiaridades essencialmente pragmáticas. Esse cidadão após anos e anos de trabalho árduo dos pais e seu, estudo e muita disciplina, conseguiu terminar o nível superior em uma universidade pública. Logo após esse feito ele também se tornou funcionário público por meio de concurso. Um orgulho e alegria para os pais, família e amigos…

Esse cidadão, após começar a trabalhar no emprego público que ingressou por meio do concurso, comprou casa e carro financiados em programas populares do governo. Casou com aquela moça que antes dele ter ascensão social nunca lhe quis e tornou-se um legalista, pragmático e religioso austero em algumas questões. Do nada ele passou a ser um fanático por um time de futebol de outro estado bem distante do seu. Comprou camisa e todo objeto que possuísse o escudo do tal time. Passou a ser muito religioso no que concerne a demonstrar que crer em Deus e faz as coisas corretamente em muitos aspectos da vida prática. Esse pelo menos era e ainda continua sendo, em tese, o discurso. Passou a criticar o jeito simples dos pais e familiares próximos. Muitos de seus familiares ouviam e humildemente concordavam mesmo ouvido severas críticas, que na verdade, eram muito mais humilhações, do que instrução para boas maneiras, como ele achava que estava fazendo. Cheguei a presenciar umas duas situações destas, na qual ele chamou um familiar de alienado, sem noção das coisas, analfabeto funcional e cérebro de ovo cozido.

Depois de um tempo casado, creio que quando a fase da paixão passou, o cidadão em questão, deu para ser um juiz implacável com a esposa. Aliás, retifico; no namoro amigos próximos comentavam que ele era muito ciumento e que a namora à época não podia nem ir em alguns lugares sem ele. Ou ia com ele, ou não ia. Ele impôs que ela não podia mais trabalhar, devia cuidar dos dois filhos e depender economicamente dele, pois a mulher deveria servir e ele devia ser o cabeça da família. Ressalvas às questões religiosas, se a mulher quiser apenas cuidar dos filhos tudo certo…, mas impor já não é algo interessante para a relação. Essa questão de não deixar a mulher mais trabalhar eu mesmo já o vi comentando sem cerimônias. Às vezes ele a reprende em público, na frente dos familiares. Ela tudo faz para agradá-lo, e assim ele vive cheio de razão, convicto de suas ideias e ideais, além de produzir e reproduzir, juntamente com boa parte da sociedade, o mesmo preconceito que antes sofrera, quando era estudante de escola pública e morador da zona rural. Situação anterior a ele se formar em universidade pública, passar em concurso público e financiar carro em 5 anos e casa em 30. Comentam as más línguas que ele tem um caso extraconjugal. Segue o jogo…Assim muitos seguem o rito social, a consciência de classe não existe, o que impera é a vontade do oprimido em se tornar também opressor.

Por Américo Neto.
EMAIL: [email protected]

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