Ceará
29 alunos da UFC tiveram matrícula cancelada por fraude em cotas raciais; entenda a investigação
Em três anos, 29 alunos de cursos diversos da Universidade Federal do Ceará (UFC) tiveram a matrícula cancelada por fraude em cotas raciais, destinadas a pretos, pardos e indígenas, após serem denunciados. O número representa 85% dos 34 procedimentos já realizados pela instituição.
Os dados são de um balanço da própria UFC a pedido do Diário do Nordeste. Atualmente, há mais 70 procedimentos de heteroidentificação em curso.
De acordo com a Universidade, a averiguação da autodeclaração é realizada por meio de um procedimento específico com direito ao contraditório e à ampla defesa. O aluno denunciado é encaminhado para comissão de heteroidentificação designada pelo Reitor.
15 membros participam da comissão, dos quais 5 fazem parte da comissão principal, 5 da comissão revisional e 5 são suplentes.
Para inibir as tentativas de uso indevido das cotas desde o princípio, a UFC decidiu adotar uma inédita validação censitária – ou seja, com todos os candidatos autodeclarados “negros pretos” e “negros pardos” – no edital 2022 do Sistema de Seleção Unificada (Sisu), adotado para ingresso na Instituição.
O método tem como novidade a inclusão de um vídeo na lista da documentação obrigatória para a matrícula na Universidade. Não é permitido utilizar maquiagem, filtros de aplicativos ou realizar cortes. Esse instrumento já era cobrado em outras universidades federais e estaduais do Brasil.
Com a implantação da validação censitária, só irão para a comissão de heteroidentificação os casos que gerarem dúvidas na análise do material audiovisual a ser recebido pela Pró-Reitoria de Graduação (Prograd).
Para candidatos indígenas, será exigido documento que comprove sua etnia, como Registro Administrativo de Nascimento de Indígena (Rani) ou declaração de pertencimento étnico, preenchida e assinada por dois representantes indígenas de sua comunidade.
O mestre em História Social e pesquisador da História e da Cultura dos negros no Ceará, Hilário Ferreira, reforça que as cotas são um caminho para corrigir problemas centenários provocados pelo racismo estrutural, mas a falta de discussões sobre o tema leva à compreensão equivocada da questão racial.
Nesse caso, estamos falando de privilégios, de brancos que querem se apropriar de uma política afirmativa que beneficia os negros. Na ausência desse debate, há uma apropriação do termo ‘pardo’ como lugar do mestiço, um grupo que abarca todo mundo e ao mesmo tempo não representa nada. É nesse vácuo que surge a deturpação do conceito.
Na leitura do especialista, a sociedade brasileira foi e continua sendo estruturada para beneficiar o grupo que representa o colonizador – os brancos -, e “isso se tornou tão naturalizado que você não sente falta do negro em determinados espaços”.
Por isso, Hilário Ferreira defende que, em vez de ser desqualificada e posta em dúvida, a política de cotas precisa ser subsidiada por estratégias de aperfeiçoamento a fim de beneficiar os públicos para os quais ela foi desenhada.
Como funciona a investigação
A ocupação das cotas ainda exige que o candidato assine uma autodeclaração, mas o documento pode ser confrontado com o relatório emitido pela comissão, que fará uma identificação fenotípica (aspectos da aparência) dos estudantes convocados a partir de denúncias de ocupação irregular.
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Em caso de divergência, o candidato pode solicitar uma segunda verificação por comissão diferente da primeira. Se persistir a divergência, o estudante deverá ter sua matrícula cancelada pelo não enquadramento às condições de cota pleiteada.
Após o procedimento, o discente pode recorrer da decisão e tem a oportunidade de apresentar defesa, caso tenha seu enquadramento indeferido. O processo é sigiloso.
Fonte: Diário do Nordeste
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