Política
O que vitória na Câmara significa para futuro de Temer?
O presidente Michel Temer demonstrou que ainda conta com a maioria dos votos na Câmara dos Deputados ao barrar nesta quarta-feira o pedido da Procuradoria Geral da República (PGR) para que fosse processado por corrupção.
Mas a perspectiva de novas denúncias da PGR, o esvaziamento dos cofres públicos e defecções na base aliada tornam incertas a conclusão do mandato de Temer e a retomada de sua agenda de reformas, segundo analistas ouvidos pela BBC Brasil.
Na votação de quarta-feira, 227 deputados se posicionaram a favor do prosseguimento da denúncia contra Temer, e 263 foram contra – bem além dos 172 votos de que o presidente precisava para arquivar a iniciativa. Dezenove deputados se ausentaram, e dois se abstiveram.
Embora tenha vencido com alguma folga, Temer viu sua base de apoio encolher a 51% da Câmara – o que pode pôr em risco sua agenda de reformas e forçá-lo a reorganizar a composição do governo, cedendo a partidos que pedem mais espaço em troca da fidelidade.
‘Tirando o Brasil da UTI’
Em nota, o vice-líder do governo na Câmara, Darcísio Perondi (PMDB-RS), disse que o resultado “dá força para que o presidente continue trabalhando para tirar o Brasil da maior crise política e econômica de sua história e avançando nas reformas necessárias”.
“Venceu a energia positiva que está tirando o Brasil da UTI”, afirmou.
Já o líder da minoria na Câmara, José Guimarães (PT-CE), disse que o “governo ganha, mas não leva”. “Sai enfraquecido e perde na governabilidade, que era a única coisa que o sustentava.”
Em outubro, quando Temer aprovou a proposta que limitou os gastos públicos, primeiro grande teste do governo no Congresso, ele obteve o apoio de 63% dos deputados. Na aprovação da reforma trabalhista, em abril, o número de votos caiu para 58%.
Em maio, a delação da JBS – base da denúncia da PGR contra Temer, acusado de receber ilegalmente R$ 500 mil por intermédio de um aliado – fez com que mais parlamentares deixassem a base.
“Daqui para a frente é esperar uma nova denúncia, começar um novo debate e ver se as ruas agem.”
A professora de ciência política da Universidade de Brasília (UnB) Flávia Biroli diz que, vencida a votação, aliados de Temer no Congresso e os empresários que apoiam o governo pressionarão o Planalto para terem suas demandas atendidas.
“Ele terá de mostrar algum serviço para conseguir se manter.”
No caso dos parlamentares, Biroli cita a bancada ruralista, um dos principais pilares do governo no Congresso. Desde que assumiu, Temer fez vários agrados ao grupo – como a aprovação de uma Medida Provisória que facilita a regularização de terras, a paralisação de demarcações de áreas indígenas e quilombolas e o alívio a dívidas de agricultores.
“Imagine então o que virá adiante, com base em que foram feitos os acordos para essa votação?”, questiona.
Mas há dúvidas sobre a força do presidente para assumir essas missões.
Para alterar trechos da Constituição, o que a reforma da Previdência prevê, Temer precisa de 308 votos na Câmara – mais que os 263 que obteve ao arquivar a denúncia da PGR.
O governo diz que parte dos deputados que votou contra Temer concorda com a reforma e endossará a iniciativa – caso do deputado Ricardo Tripoli (SP), líder do PSDB, que votou a favor do andamento da denúncia na quarta.
“Essa votação representa a preocupação de investigar esse fato especificamente. As reformas são mais importantes do que tudo”, afirmou o tucano.
O presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), que se absteve na votação, disse que a reforma da Previdência ainda é uma prioridade, mas que será necessário muito trabalho para angariar os apoios necessários à aprovação.
“O importante é que a Câmara tomou sua decisão. O que a gente não podia era ficar postergando. Agora temos um longo caminho, o Brasil tem uma crise fiscal profunda.”
Ele lembra que, em maio, uma pesquisa do Datafolha revelou que 71% dos brasileiros são contra as mudanças propostas na Previdência.
Assessores do governo têm indicado que, antes da Previdência, Temer pode tentar aprovar a reforma tributária, tarefa que considera mais fácil.
Para Monteiro, o presidente também será pressionado a reduzir o espaço do PSDB e expulsar o PSB do governo. Dono de quatro ministérios, o PSDB liberou o voto dos seus deputados: 21 foram favoráveis ao prosseguimento da denúncia, 22 foram contra, e quatro se abstiveram.
No PSB, que ocupa um ministério, 20 deputados votaram a favor da denúncia, 11 votaram contra, e dois se abstiveram.
O professor diz que, se reduzir o espaço do PSDB e PSB, Temer deve ampliar o quinhão de partidos que se revelaram mais fiéis ao governo na votação, como PP e PR.
Ainda assim, afirma que a convivência do governo com a base será mais difícil. “Quanto menor a base, maior o custo unitário de cada apoio. O governo vai ficar cada vez mais refém de uma base cada vez mais estreita.”
Ele diz que outro desafio à manutenção dos apoios é o esvaziamento dos cofres públicos – exposto pela paralisação nas emissões de passaportes em junho, por exemplo.
No fim daquele mês, o vice-líder do governo na Câmara, Darcísio Perondi (PMDB-RS), disse à BBC Brasil que a liberação de emendas parlamentares era parte da estratégia do governo para garantir apoios. O aperto nas contas, porém, “reduz a margem para fazer bondades”, diz o professor.
Fonte: BBC