Dia-a-Dia com Maria

Dia-a-dia com Maria: Não precisa “SE LASCAR”!

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Havia rigidez na criação, a orientação familiar era severa e assim, crianças e adolescentes costumavam pedir a bênção a todos os tios, mesmo que de parentesco distanciado, e até aos mais velhos de modo geral. De pequenina, logo que via uma pessoa nesses moldes, estirava minha leiga mão. No hábito, fiz para um louco que chegou na casa da Vó Chiquinha (minha materna), o famoso “Bastião Doido”, tanto é que o dito fez gozação da minha ingênua reverência e perguntou: “- Essa bichinha é doida?”

Entendi que aquilo era insuportável, ultrajador e chorei quietinha pela desmoralização… Raiva!

Com o tempo, fui achando sem sentido esse esticar de mão a torto e a direito, os comadrismos e primismos celebrados na fogueira… Minha mãe era cheia de “primas” de brasa e cinza, cada junho era mais um magote. Nunca adentrei nessas maneiras e cedo comecei a fumaçar por dentro, vontade de mudar os jeitos, a cultura parentescal absurda, tudo fácil de se encher de parentes sacramentados nas fogueiras de junho.

Palavrão não se dizia, nem se respondia com malcriação aos mais velhos, pedia-se licença e todo mundo era “senhor” e “senhora”. No máximo, um cotoco ligeiro, meio de raspão, dependendo da queixa ou um cotoco revirado, tudo, formalidades que dominavam o puritanismo das pessoas.

No meu afã de tentar entender tanto gosto insosso, ouvi uma expressão mágica que me dominou: “-VÁ SE LASCAR!”

Foi assim: o rapazote era meio destrambelhado e um dos filhos mais moços da numerosa família, falava alto, gaguejava e não usava filtro quando queria dizer uma eguagem ou desaforo. Nisso, uma das irmãs lhe importunava a ir pegar para ela um galão de água na cacimba (montagem de duas latas de flandre, penduradas com cordas numa vara e conduzida no ombro). O mano, cansado da roça, primeiro disse que “não” ia. A moça insistiu e ele gritou com força: “- Home, vá se lascar!”

Rostos petrificados, silêncio de choque e ninguém mais ousou pedir-lhe o favor, finalmente, liberto por uma frase: “VÁ SE LASCAR!”

Nesse escape, não vago aturdir, encontrei o valor das palavras ditas no momento oportuno.

Possivelmente o leitor ache sem grande valia este texto e, sendo sincera, também não vejo futuro, mas que fica nítido o poder do que se fala (escrito ou verbal), fica sim! Amostra funcional, espécie de alvará libertador: “VÁ SE LASCAR!”

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