Noticias

Dia-a-Dia com Maria: Racismo manifestamente aceso

Published

on

Por Maria Lopes*

Zigoto racista
Quando a primeira nau portuguesa acostou-se à Ilha de Vera Cruz, nasceria o primeiro choque racial no Brasil: de um lado, os nativos diferenciados dos colonizadores, estes, nus e bronzeados e, do outro, os chegantes com a urgência de ‘pacificarem’ o contato, “desdobrando” a raça da terra, “sem pudor”, com prendas baratas.

Entendo que a partir de então possa ter se iniciado neste torrão, a inferiorização sem precedentes de uma gente (índios), que seria forçada a novos costumes e vista como de capacidade mental inferior, inclusive.

Posteriormente, com a vinda de negros africanos na condição de escravos, a configuração do preconceito tendeu-se a se intensificar, de maneira que, mesmo havendo a mescla dessa população (da cor de cobre do nativo, com a tez preta do africano e a alvura portuguesa), prevaleceu a valoração da cor branca do europeu, tanto é que fomos orientados para a devoção a uma suposta aparência de um Cristo loiro de olhos azuis, de santos loiros e branquinhos como a neve.

Depois, certamente para compensar os danos e a descarada preferência pelo tom de pele claro, passaram a imaginar algum santinho preto como São Benedito e os gêmeos Cosme e Damião (da religião católica, do colonizador).

Racismo configurado
No Brasil, o racismo está estampado na história, na literatura, na própria estrutura de colonização, no fomento à imigração para dar uma “limpada” no caldeirão escurecido, quando os negros foram impedidos por uma lei retardatária, diga-se de passagem, de serem arrastados por um laço como animal bravio ao trabalho pesado.

Na dita literatura racista, não se pode dispensar um trecho do espetacular, Monteiro Lobato, na sua travessa, ainda que genial obra, “Sítio do Picapau Amarelo”, ao apresentar ao seu público duas das personagens, Tia Nastácia e Tio Barnabé, caricaturalmente figuras aparentadas (tios), mas que eram iletrados e encarregados dos fardos pesados do sítio, governado pela branca e culta avó, Dona Benta.
Em outra obra, o fabuloso poeta Manuel Bandeira, assinala a entrada da “preta Irene” no céu, quando pelo menos a ela não lhe foi negado o ingresso ao paraíso divino.

Racismo que mata
Nos dias atuais, essa coisa de racismo tem se espichado ferrenhamente de maneira que já se torne preocupante o relevo dos atos que marcaram as principais manchetes de jornais, sendo talvez a mais repugnante, a citar nesta oportunidade, o caso do adolescente negro, acusado de praticar furtos na zona sul carioca, que foi preso a um poste, amarrado na Avenida Rui Barbosa (Bairro do Flamengo), e que teve orelha cortada e fora espancado até a morte (2/2/2015). Tal fato imprime um verdadeiro despautério numa nação em que brancos e limpinhos engravatados furtam, surrupiam bilhões e nem um puxão de orelhas se lhes aplicam.

A bela Wiara Brown
Para concluir nosso entendimento, atente-se para a escolha feliz da nossa linda e exuberante negra, rainha dos estudantes de Iguatu em 2015, Wiara Brown, quando nas redes sociais foram difundidos alguns comentários sobre a “má escolha” dentre as belas, como se só nas peles claras fosse possível se encontrar a beleza.
Nesse contexto, tenho que rememorar a nossa base normativa tão bem amparada pela Constituição Federal, no seu artigo 5°, na Lei nº 7.716, de 5 de janeiro de 1989 e nas promovidas campanhas contra manifestações de preconceito racial, na criação de cotas para melhor amparar uma parte da nação, subtraída em direitos por tantos séculos e que certamente não tiveram as mesmas oportunidades que outros grupos raciais, dadas as condições nas quais permaneceram quando foi assinada a Lei Áurea, quando de escravos, para sobreviverem, a maioria submeteu-se a uma servidão humilhante: sem estudos, sem terras, sem recursos, sem aceitação social.

Célebre beleza negra da amada do Rei Salomão
Encerrando o enaltecer da mais excelente sabedoria, recorro ao livro “Cantares” do Rei Salomão, em sua poética de amor tão bem afirmada, ao descrever a mulher de seus encantos (uma negra) da seguinte forma:

“Que belos são os teus amores, irmã minha! oh esposa minha! quanto melhores são os teus amores do que o vinho! e o aroma dos teus bálsamos do que o de todas as especiarias”. (Cantares de Salomão 4:10)

*Mariazinha é advogada e escritora

EM ALTA

Sair da versão mobile