Dia-a-Dia com Maria: No fundo, existe uma Cinderela dentro de você!

Há mais de um século, os irmãos chamados Jacob e Wilhelm Grimm, criaram a dita personagem, que sem dúvida, faz parte do seu ser, podendo ter a forma de senhora, mocinha ou de experiente dama chacoalhada. 

Essa mulher que, com ares de donzela, espera no sofá, na janela, soleira da porta, calçada, ou rua acima e rua abaixo que um dia apareça um homem interessante que a leve ao mundo de encantos. Que seja bem humorado, tenha beleza visível, diga-lhe coisas maravilhosas, muito boas de se ouvir, do tipo, “você era a parte de mim que faltava!” Ou então, “onde você se escondeu esses anos todos?” e a pensativa sonhadora que tem até vontade de dizer por onde andou, mas, por medo de perder a caçada, prefere calar-se, afinal, ela vai dizer com quantos dublês de príncipes esteve enrolada, quantos “nãos” sonoros escutou, quantas desculpas esfarrapadas, binadas ao celular, mentiras, indiferenças, chifres suportou!? Não! Isso nunca! Apenas olha seu emanado do paraíso e responde-lhe:

– Estive a esperar por alguém como você, meu anjo! Agora, eu é que quero saber por onde você esteve, por que demorou tanto a vir até mim.

O anjo olha rapidamente dentro dos olhos de sua ‘princesa’, desviando-os como um relâmpago e divaga (enquanto ouve com fone de ouvidos: “mentiras sinceras me interessam…”, Cazuza).

E prossegue:

– Contemplei o mundo e achei que nunca ia encontrar alguém que valesse a pena sonhar com um futuro a dois…

E pensa: “e se eu contasse que larguei minha pobre noiva, me envolvi com aquela quenga safada, puara do cão que, além de engravidar sem meu consentimento, ainda me pôs um par de chifres!?” Ou, que “tive um caso com meu patrão, que me deixou de lado quando contratou um novo office-boy?!” Deus me livre!

E Cinderela, cujo nome pode ser Cicinha, tão malhada em camas de motel, escurinhos propícios, programinhas de fim de semana, regados à cachaça barata com qualquer tira-gosto, seguidos de ressacas tenebrosas, agora prepara o quadro condutivo a não deixar se perder a oportunidade de definir seu estado civil. Cansou de responder aos que lhe perguntavam que era uma mulher “enrolada”. Chato, isso! Queria ser noiva, casada, esposa… poder falar do maridão com as amigas, outras perdizes que, por mais que se dissessem “independentes”, sentiam-se rejeitadas pelo acaso, contempladas pela escassez de homens interessados.

E nesse arranjo desesperado para solidificar o relacionamento com o “Gataço”, que na verdade, estava mais manjado do que canja de galinha no boxe do Mercado Central, mas, afinal, pressente a iminência de conseguir a definição desse ‘príncipe’, que sem lhe medir os pezinhos para calçá-la com saltinhos de cristal, pelo contrário, com o novo emprego que a além-ficante arranjara, ela é que compraria sapatos para ele, bem (mal) acostumado a explorar os encantos de aluguel.

Menos de meio ano de namoro, casam-se com todas as pompas. Ela, aliviada e cheia de esperanças, programando a família mais fofa da comunidade. Ele, convicto de que já nem mais estava com essa bola toda para escolher, dando-se por satisfeito com essa fada que agora, incansável, para ele faria pratos caprichados, arrumaria as camisas, calada lavaria o banheiro com cheiro forte de xixi e, cansada, pelo dia exaustivo de trabalho, dormiria ao lado do príncipe que aromatizaria sua vida com o título de senhora e a alcova do casal com os puns sonoros.

E assim viveriam felizes e superados para sempre.

*Mariazinha é Servidora do IFCE Campus Iguatu e Advogada