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Empregados domésticos buscam outras formas de renda durante pandemia

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Parte da população cearense aderiu ao isolamento social e, quando possível, ao home office – o trabalho de casa – para se proteger do novo coronavírus. Mas a situação não é tão simples para trabalhadores cujo serviço deve ser presencial. Diaristas, empregadas domésticas, babás e motoristas, por exemplo, encaram um dilema: ficar sem pagar as contas ou se expor ao vírus, saindo de casa? Em todo o Ceará, cerca de 276 mil pessoas se enquadram na categoria do trabalho doméstico, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).

“Mudou tudo. As clientes ficaram com receio, porque a maioria é idosa. Estou há um mês parada”, conta Elis Regina Holanda, diarista há 15 dos 39 anos de idade, nos quais nunca enfrentou um período tão complicado. “Algumas delas tinham médico na família e avisaram: ‘olha, é melhor você ficar em casa'”, relata ela, que tinha agenda cheia de segunda a sábado. Hoje, se mantém com o apoio de algumas clientes que continuam a depositar a remuneração e, como também é cozinheira, por algumas encomendas de bolos – “um pingado”.

Contudo, a renda do lar no bairro Jacarecanga “está mesmo nas costas do meu esposo”, responsável pela manutenção de um prédio. Como ele continua a sair de casa, os seis filhos do casal estão dispersos nas casas de outros parentes. Contato mesmo, só por videochamada. “Sei da minha necessidade, até porque alimentação e higiene estão caros, mas preciso ficar em casa. O que podemos economizar a gente está fazendo”, diz Elis.

No Ceará, cerca de 41 mil trabalhadores domésticos tinham carteira assinada, no último trimestre de 2019, de acordo com a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (Pnad). Outros 235 mil desempenhavam a função sem garantias legais – esmagadores 85% do total.

Na conta, o IBGE considera as atividades prestadas por cozinheiros, copeiros, arrumadeiras, motoristas, lavadeiras, passadeiras, babás, jardineiros, governantas e caseiros. Os dados do primeiro trimestre de 2020 ainda não foram divulgados e não há detalhamento por municípios.

Sustento

Algumas clientes fixas “de anos e anos” de Mylene Correia, 57, também pediram-lhe para ficar em casa. Outras a dispensaram. O dinheiro que a sustenta hoje, então, vem de duas delas: cada uma deposita cerca de R$120 por semana. Ainda assim, o valor é insuficiente para pagar o aluguel de R$650 no bairro Vila Manoel Sátiro. “Conversei com o dono e, pelo menos, ele entendeu”, afirma.

A diarista também aguarda a liberação dos R$600 do auxílio emergencial concedido pelo Governo Federal, mas “até agora, nada”. Ela até recebeu uma proposta de trabalho para hoje, em Messejana, mas tem medo de se deslocar. “Essa doença está alastrada em tudo que é canto, então tenho que cuidar da minha saúde. Tenho artrose, as pernas tortas, mas graças a Deus dou conta do trabalho”, garante.

Uma pesquisa do Instituto Locomotiva mostrou que, no Brasil, 39% dos empregadores de diaristas desistiram do serviço das profissionais sem manter o pagamento. Por outro lado, 23% dos patrões de diaristas e 39% daqueles de mensalistas disseram que as funcionárias continuam trabalhando normalmente, mesmo na quarentena.

O professor Irapuan Peixoto, integrante do Laboratório de Estudos e Pesquisas em Política e Cultura da Universidade Federal do Ceará (Lepec/UFC), lembra do risco a essa categoria de trabalho, porque, na necessidade de deslocamento para trabalhar, elas ficam mais vulneráveis à contaminação pela Covid-19, principalmente no ambiente fechado do transporte público.

“Chama atenção que tipos de postos de trabalho elas ocupam: são babás, faxineiras, porteiros, zeladores. Quem realiza esses serviços continua a trabalhar, seja para empresas, condomínios ou famílias. No caso específico da Aldeota, há muita demanda, que levam uma grande quantidade de pessoas a esse deslocamento”, explica.

Na Aldeota, bairro para onde há maior deslocamento de trabalhadores, os casos confirmados chegaram a 189, com quatro óbitos, segundo o último boletim epidemiológico da Secretaria Municipal de Saúde (SMS), divulgado quarta-feira (22). No vizinho Meireles, são 238 confirmações e oito óbitos.

Para evitar o deslocamento de risco, a empregada doméstica Maria Eliede dos Santos, 57, está há um mês sem pisar em casa. “Convivo com uma idosa de 94 anos, que está na área de risco, e também sou diabética. Se eu fosse em casa, não voltava mais, tanto por mim quanto por ela. Preferi ficar, senão não tem de onde tirar”, relata ela, que vive na expectativa de rever outros locais. Sem família em Fortaleza, ela aguardava visita de uma irmã que mora em Teresina. Marcado para o início de abril, o encontro precisou ser cancelado.

Fonte: Diário do Nordeste

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