Ceará
Apesar da seca, engenho de cana mantém atividades na zona rural de Iguatu

Mesmo com a seca e a modernidade que afeta muitas atividades, os engenhos de cana permanecem em atividade em alguns locais, especialmente na zona rural. Um exemplo disso é o engenho do senhor Francisco Rufino César, de 82 anos, no sítio Junco, distante cerca de 30km do centro de Iguatu. No último mês o engenho esteve em atividade, produzindo rapadura, mel e outros produtos típicos, funcionando aos sábados e domingos.

Mestre de moagem Eudes Alexandre entre as nuvens de vapor transferindo a garapa de um tacho para outro foto Jan Messias
Na manhã deste domingo, 06, ocorreu a moagem final da safra. A principal reclamação do Sr. Francisco César é a seca. Segundo ele nos últimos 3 anos não houve produção por falta de chuvas, mas neste ano a vontade de plantar foi maior e ele resolveu aproveitar a água que restou nos dois açudes da propriedade e cultivar parte do terreno.
Ele afirma que a safra já foi melhor, em tempos de mais chuvas. Outro problema relatado por ele é a falta de interesse: ” esse povo mais novo não se interessa mais por isso, prefere comprar tudo de fora, não tem vontade de fazer o mel, a rapadura, a garapa e se não for a gente para insistir isso aqui acaba e cai tudo”, lamenta.
Trabalhadores carregam lenha para as fornalhas do engenho. Sítio Junco, Iguatu, Ceará. Foto Jan Messias
Segundo o sr. Francisco, o engenho se encontra em atividade desde antes de ele nascer: “Quando eu nasci e me entendi por gente isso aqui já fazia muita carga de rapadura para a região toda. Criei meus 16 filhos por aqui e antes tinha outros engenhos aqui perto, mas foi, aos poucos acabando tudo”. Francinete Rufino, filha do sr. Francisco, luta para que a moagem não pare. ” A gente vê nosso pai desanimado, mas a gente não quer que ele pare, porque isso aqui é bom para a gente, uma tradição nossa desde pequena”, conta.
Mais que trabalho, a moagem de cana é um momento de rever parentes e aproveitar protutos típicos, mas difíceis de encontrar no mercado, como o alfenim uma massa de açúcar, seca, muito alva, muito procurada, especialmente por crianças que gostam de brincar modelando enquanto a massa não ‘morre’, como é dito quando ela endurece.
Outro produto bastante apreciado é o caldo de cana, logo que sai da moagem. Os compadres vão tomando o caldo como um refresco para aliviar do calor do trabalho.
Trabalho complexo
A produção em um engenho de cana é complexo e envolve várias etapas, desde o corte da cana até o preparo da rapadura e do mel. A moagem é movimentada por um motor antigo, movido a óleo diesel e a ‘garapa’ é levada para tachos onde vai ser cozida para ‘apurar’ e virar os demais produtos. Há também um responsável por manter o fogo aceso sempre para que o caldo vá sendo cozido corretamente.
No engenho do Sítio Junco os mestres de moagem são os irmãos Eudes e Eugênio Alexandre que comandam os tachos quentes entre as nuvens de vapor que se elevam com o calor. “Eu me criei vendo isso aqui, aí fui aprendendo, de tudo eu já fiz nesse engenho, desde cortar a cana até levar lenha pro fogo. Não dá para saber tudo, mas fui aprendendo a cuidar dos tachos quentes e dar o ponto do caldo. Se sair alguma coisa errada prejudica a produção toda”, afirma Eudes Alexandre enquanto vai passando o caldo quente.
Atração turística
Em busca dos produtos, muita pessoas vem de Iguatu e das comunidades nas proximidades do engenho. Foto Jan Messias
Apesar da distância da cidade, muitas pessoas procuram os produtos do engenho, até mesmo pessoas da cidade. Francisco Cesário foi em busca de mel de engenho. ” A gente vem porque isso é uma novidade pra nós, nem sempre funciona e a gente tem que aproveitar enquanto produz para compar mel, rapadura e aproveitar também conversar, rever conhecidos”, conta. Pessoas das comunidades próximas também aproveitam a moagem, como é o caso da senhora Nesci Clares, de 80 anos, que caminhou cerca de 6km para comprar mel. “Vim caminhando mesmo, devagarinho. O pessoal de carro oferece carona, mas gosto de vir caminhando mesmo. Meus filhos estão trabalhando hoje aqui e meu esposo, falecido, trabalhava aqui”, relembra.