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Saída de Teich escancara incertezas na condução da crise na Saúde

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Nelson Teich não conseguiu atingir os 30 dias à frente do Ministério da Saúde. Em meio à pandemia, ele anunciou ontem o pedido de demissão do cargo e se tornou o segundo ministro a deixar o comando da Pasta em meio à crise sanitária causada pelo novo coronavírus no País. As razões para a saída seguem o mesmo roteiro daquelas que fizeram o antecessor, Luiz Henrique Mandetta, deixar o Governo: divergências quanto ao uso da cloroquina em estágios iniciais da Covid-19, devido à falta de estudos conclusivos sobre a eficácia do medicamento, e quanto ao fim do isolamento social, no momento em que o Brasil supera as 14 mil mortes por Covid-19.

A defesa das duas medidas tem sido posicionamento inflexível do presidente Jair Bolsonaro (Sem Partido), apesar das indicações contrárias de autoridades de saúde do mundo inteiro. Ele segue, agora, para a escolha do terceiro ministro da Saúde em menos de dois anos de Governo.

A gestão de Teich teve pouca efetividade nas medidas de contenção à pandemia. Durante curto pronunciamento após deixar o cargo, o ex-ministro citou apenas as habilitações de leitos de Unidade de Terapia Intensiva (UTI) no País, além da compra e distribuição de Equipamentos de Proteção Individual (EPIs) e de respiradores. Falou, ainda, de viagens realizadas a cidades mais atingidas pelo vírus. As duas ações que haviam sido foco do discurso que fez ao tomar posse foram ressaltadas como sendo suporte para futuras medidas.

Programa de testagem para a doença, sobre o qual não entrou em detalhes, foi definido como “fundamental para definir estratégias e ações”. Além disso, disse deixar um plano com diretrizes que indicam diferentes níveis de isolamento social a serem adotados por estados e municípios, com base na avaliação de diferentes indicadores. O planejamento havia sido ponto de divergência do então ministro tanto com secretários estaduais e municipais de saúde quanto com o próprio presidente.

Explicação

Apesar das divergências que o levaram a deixar o cargo, Teich evitou explicar as razões da saída ou tecer críticas ao presidente e agradeceu a Bolsonaro pela nomeação. “A vida é feita de escolhas e hoje escolhi sair”, afirmou. A demissão, no entanto, ocorreu após uma semana de desgaste entre ele e Bolsonaro.

Na segunda-feira (11), Nelson Teich foi informado pela imprensa de decisão do presidente de aumentar a lista de atividades essenciais com salões de beleza, academias e barbearias. O fato reforçou a visão de que o ministro estava afastado de decisões que interferem em recomendações da área da Saúde.

Contudo, a gota d’água foi motivada pela insistência de Bolsonaro em aplicar o uso da cloroquina para tratar pacientes com Covid-19. Teich havia chegado a consultar pesquisadores nos últimos dias sobre os estudos envolvendo a droga. Foi aconselhado a não acatar a ideia do presidente. Na quinta-feira (14), os dois conversaram e não houve acordo sobre o tema.

Mais tarde, em uma transmissão ao vivo, Bolsonaro insistiu no tema e disse que haveria mudança no protocolo do Governo em relação à cloroquina, o que desagradou ao ministro. Quando, ontem, o presidente disse que a Pasta passaria a recomendar o uso do medicamento logo no início do tratamento de pacientes com a infecção, o ministro preferiu deixar o cargo.

A conversa que os dois tiveram no Palácio do Planalto durou cerca de 15 minutos e o pedido de demissão surpreendeu inclusive assessores próximos ao presidente. O secretário-executivo, general Eduardo Pazuello, assume interinamente. Ele é cotado para ficar definitivamente no cargo.

Pouco após o anúncio do pedido de exoneração, a médica Nise Yamaguchi, uma entusiasta do uso da cloroquina para casos de Covid, esteve no Palácio do Planalto. O médico Cláudio Lottenberg, do Sírio Libanês, e Ludmila Hajjar, do Hospital do Coração, cotados na saída de Luiz Henrique Mandetta, também voltaram a ser avaliados.

Repercussão

Antecessor no cargo, Mandetta afirmou que a gestão de Teich “foi um mês perdido, que jogaram fora no meio da pandemia”, em referência à dificuldade do sucessor em nomear equipe e adotar ações. “Talvez ele deva colocar lá uma pessoa que não seja médica, que não tenha muito compromisso e possa acelerar o que ele quer, porque fica difícil para um médico passar por cima de princípios básicos da ciência”, acrescentou.

Governadores também criticaram a postura de Bolsonaro. Camilo Santana (PT) disseque as mudanças trazem insegurança para o Brasil. “É inadmissível que, diante da gravíssima crise sanitária que vivemos, o foco do Governo Federal continue sendo em torno de discussões políticas e ideológicas. Isso é uma afronta ao País”, apontou.

Outros cearenses também mostraram preocupação com a saída de Teich e com os posicionamentos do presidente diante do quadro da Saúde no Brasil. O senador Tasso Jereissati (PSDB) criticou a “falta de coordenação do Governo” e considerou uma “irresponsabilidade inimaginável” a troca no comando do Ministério.

A deputada federal Luizianne Lins (PT) afirmou que a Pasta da Saúde está “um caos em meio à pandemia e o povo completamente desprotegido”. André Figueiredo (PDT), líder da Oposição na Câmara dos Deputados, chamou a conduta de Bolsonaro de “irresponsável”, enquanto Célio Studart (PV) afirmou que o presidente “não quer um médico ou técnico para nada. Ele quer capachos”.

O deputado Heitor Freire (PSL), apesar dos posicionamentos mais alinhados ao Governo, disse estar surpreso “com a saída precoce” de Teich e citou solicitação de visita do ministro ao Ceará. Ele disse ainda torcer “para que, além de primar pelos critérios técnicos, a escolha seja mais sólida e segura”.

José Guimarães (PT), por outro lado, afirmou que o “Governo está em frangalhos” e declarou que os brasileiros “não são cobaia”. O presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), e o presidente do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP), não se pronunciaram especificamente sobre a demissão de Nelson Teich, assim como o presidente do Supremo Tribunal Federal, ministro Dias Toffoli.

Fonte: Diário do Nordeste

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