Dia-a-Dia com Maria

Da maçã ao tamarindo (in Farpas e Pétalas)

O sentido ligado à gustação talvez seja o mais aguçado do ser humano,provavelmente por se vincular à necessidade vital de se alimentar e de suprir sua máquina, cujo combustível é a comida. 

Published

on

O sentido ligado à gustação talvez seja o mais aguçado do ser humano,provavelmente por se vincular à necessidade vital de se alimentar e de suprir sua máquina, cujo combustível é a comida. 

O homem nasce chorando (normalmente) e, segundo as pesquisas, recebe e responde constantemente os estímulos ambientais com os sentidos que precisam se maturar no tempo para o aprimoramento. Assim, logo após os primeiros dias, embora os bebês não possuam os botões gustativos totalmente desenvolvidos, podem diferenciar o doce do azedo e preferir o primeiro sabor.

Durante milhões de anos a terra foi habitada pelos hominídeos, nossos antepassados que procuravam sobreviver por meio a coleta alimentar, começando pelos frutos eu tanto os atraíam pelo cheiro quanto ela aparência.

Corroborando a tese da sedução pelo alimento, voltemos ao paraíso da criação onde a maçã vermelha foi a causadora da derrocada do homem. Se ele realmente comeu foi uma maça, não sei, porém a Bíblia metaforizou (e não discordo). Os próprios deuses, segundo a crença, eram agradados (e ainda são) com manjares, sendo que mais fuleiros, até um prato de pipoca com mel aformigado lhes apetece. Não são raros os casos  de casais que afirmaram terem-se ligado um ao outro pelo estômago, inclusive, uma apaixonada tentou prender um tio meu com tapioca. 

Verdade!

Todo esse aparato expositivo sobre a força do paladar remete-nos à galeria das mulheres-frutas da atualidade, no intuito de manifestarem o caráter sedutor das indivíduas. Assim, temos a mulher Melancia, Pera, Melão, Moranguinho, Jaca, Cereja, Mangaba etc., isso no Sul. 

Por cá, apareceram umas que se denominaram de Caju, Cajá, Cajarana e Graviola, além de outras três que, indecisas, viram até mim e pediram que eu analisasse-lhes as condições pessoais, de forma a relacionar-lhes com alguma fruta.

De pronto eu não tinha como dizer nada, então pedi-lhes um tempo para melhor abalizar minha mensuração. Ao cabo de longas duas semanas, cheguei às sugestões: uma delas seria a mulher Juá, a outra delas, a Ata; e a terceira, a Tamarindo.

Obviamente vou fornecer toda a clareza ao leitor. O fruto do juazeiro, o juá, da estação invernosa, cai com facilidade e, por ser do tempo das chuvas, mistura-se à lama, sendo bem comum. E qual seria a relação dessa fruta com a criatura? Bem, a moça tem épocas em que atrai muitos assediadores, porém, quando se afastam, nem o sal do mar para tirar-lhe as quizilas do couro abandonado e, em nada sendo seletiva, acaba sendo destroçada pelo que se deixa pisotear. Pelo visto, nunca se permite ser conquistada, atira-se ao sopro do vento, cai e decai sem relutar, de modo que tornou-se meio amargosa do tanto que já foi doce. Apesar da consistente aparência de casca grossa, que mostra de vez em quando, na primeira ‘degustada’ comprova que essa firmeza não passa de uma gelatina e se deixa abusar: roída estraçalhada, moída e, por fim, descartada num sopro, sobrando de si apenas um caroço dado ao solo, que a ampara silencioso. 

Quase inútil!

A outra, a Ata, é tida como a “gostosona”, um doce de ser, mas de longe se permite mostrar as rachaduras, o interior, suas feridas, a lasqueira moral, e logo amolece na primeira pegada, abre-se sobremodo, conta tudo, passado, sonhos, presentes, casos, segredos, fracassos, escancara geral, no fim, sem mistérios e novidades, é descartada, sobrando-lhe a casca e as negras sementes que hão de gerar novas oportunidades de fazer o mesmo besteirol. Nunca aprende, nem se rende à dor das experiências.

E por último, a Tamarindo que se fecha e se acha tanto, tem personalidade rara, mas em nada contribui com o próprio êxito nos relacionamentos. Um azedume de mulher, que reclama da rejeição dos “nada sortudos” por não a preferirem. Mantém-se à sombra da névoa da tradição da parentela importante, tão grandiosos quanto à fatalidade de seu infortúnio amoroso. Nesse continuísmo de cega e inflexível, a vida passa e ela se isola sem a menor viabilidade de ser célebre e plena como gostaria. 

Azeda, azedíssima, cheirando a Chanel e desfilando em viagens com suas malas da Louis Vuiltton.

 

*Mariazinha é Servidora do IFCE Campus Iguatu e Advogada

 

EM ALTA

Sair da versão mobile