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Bancada cearense é a que menos vota com o Governo Federal na Câmara dos Deputados

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A bancada cearense na Câmara dos Deputados é a menos alinhada aos posicionamentos do Palácio do Planalto. Entre todos os estados, os parlamentares cearenses foram os que menos acompanharam o líder do Governo nas votações no plenário da Casa durante os dois primeiros anos de mandato do presidente Jair Bolsonaro. Entre os motivos apontados por especialistas e parlamentares para a postura, estão a pressão exercida pela base eleitoral e a força do governador Camilo Santana (PT).

Segundo dados do Radar do Congresso, plataforma criada pelo portal Congresso em Foco, os deputados cearenses seguiram a orientação do líder do Governo em 59% das votações nominais, o menor índice do País. O levantamento tem como base 336 votações realizadas no plenário da Câmara em 2019 e 2020.

Apesar de ser a bancada menos alinhada ao presidente Bolsonaro, o Ceará possui parlamentares que seguiram as orientações do líder do governo em quase todas as votações na Câmara. É o caso do deputado Dr. Jaziel (PL), líder, dentre os cearenses, em acompanhar a posição do Palácio do Planalto, tendo o feito em 98% das votações. Na sequência, estão Júnior Mano (PL), 97%; AJ Albuquerque (PP), 96%; Domingos Neto (PSD), 96%; e Vaidon Oliveira (Pros), 94%.

Por outro lado, alguns parlamentares tiveram índice de governismo bem abaixo da média da bancada cearense. José Airton (PT) foi o que menos votou com o governo – caso de apenas 21% das votações. Na sequência, entre os menos alinhados, estão José Guimarães (PT), 23%; Idilvan Alencar (PDT), 27%; e Denis Bezerra (PSB), 32% (ver quadro).

Pressão das bases eleitorais

A cientista política Carla Michele Quaresma aponta que o baixo índice de alinhamento diz respeito à relação que os deputados constroem com as bases eleitorais, principalmente nos municípios, e a pressão exercida por elas. “Este é o Poder (a nível federal) que melhor representa a diversidade na sociedade e é muito pressionado pelas demandas da população do estado”, diz.

Ela cita a avaliação negativa de Jair Bolsonaro no Ceará, um estado no qual o presidente foi derrotado em 2018.

“Os parlamentares acompanham essa tendência em uma tentativa de manter a legitimidade. A rejeição acaba sendo por essa necessidade de ter o respaldo popular e corresponder às expectativas do eleitorado”, destaca Quaresma.

Deputado federal pelo PDT, Eduardo Bismarck também associa o baixo índice de alinhamento da bancada com a relação entre os parlamentares e as bases eleitorais. “Não necessariamente a orientação do governo é voltada para a população. Muitas vezes, está mais para o espírito orçamentário do Governo”, afirma.

No caso dos deputados cearenses, Bismarck aponta que, por virem de um estado com menos riquezas e com uma desigualdade alarmante, os parlamentares estão mais preocupados em minimizar estes problemas. Uma preocupação compartilhada, inclusive, com outros estados da região.

Outros estados nordestinos também têm um índice baixo de governismo, como Paraíba, Pernambuco e Bahia. Uma tendência iniciada ainda nas eleições de 2018.

“O Nordeste tem uma base eleitoral forte de oposição e não houve, por parte do Governo Federal, uma tentativa de locução e diálogo com os governadores, pelo contrário. Isso acaba distanciando a representação parlamentar”, argumenta o cientista político Cleyton Monte.

A força do governador

Com 22 deputados, a bancada do Ceará possui uma alta representatividade de partidos que integram a oposição a Bolsonaro. Portanto, “não é do interesse dos deputados votar pautas com o Governo, porque muitas vezes isso é contrário ao próprio partido que representam”, explica Cleyton.

O pesquisador aponta ainda a relevância de lideranças opositoras ao chefe do Executivo, como o próprio governador Camilo Santana (PT) e o ex-presidenciável Ciro Gomes (PDT). “Os governadores têm um poder de barganha grande frente aos deputados. No caso do Camilo, isso é mais forte devido à popularidade dele”, afirma o pesquisador.

O deputado Heitor Freire (PSL) critica a força de lideranças estaduais com a bancada. “Existem deputados que não estão interessados prioritariamente no bem do povo, preferindo atender primeiro aos seus interesses pessoais. Sem contar o domínio dos Ferreira Gomes no pulso de boa parte dos deputados”, diz Freire em referência à força política dos irmãos, ex-governadores do Ceará, Cid e Ciro Gomes.

Danilo Forte (PSDB) concorda. “O poder político local tem um controle grande sobre seus pares. Parlamentares acabam com medo de fazer questionamentos em temas que são tratados de forma ideológica e que não levam em conta as necessidades que o País precisa enfrentar”, afirma.

Coordenador da bancada cearense, Bismarck rebate. “O governador, em hipótese alguma, influenciou qualquer pauta ou passou nenhum tipo de orientação em votações”.

Líder da Minoria na Câmara, José Guimarães considera que o posicionamento oposicionista da bancada tem relação com a posição da população. “Estamos sintonizados com que o povo pensa e, ao mesmo tempo, evitando que os nossos votos ajudem a aprovar propostas ‘retiradoras’ de direito”, completa.

Para Cleyton Monte é uma questão de equilibrar os interesses. “Para um deputado, é interessante estar com o Governo Federal quando tem retorno da base eleitoral, quando tem apoio ideológico ou quando tem recursos”, diz. “Os recursos estão difíceis e a rejeição dos eleitores ainda está forte”, pontua.

Alinhamento dos senadores

Já os senadores são mais alinhados ao Governo Federal. Segundo o Radar do Congresso, os três senadores cearenses votaram alinhados ao Planalto em 84% das votações. O levantamento foi realizado a partir de 183 deliberações ocorridas no plenário da Casa.

No Senado, a bancada mais alinhada com o Governo Federal é a do Acre – com índice de 95% -, enquanto a menos alinhada é a do Rio Grande do Norte – com índice de 77%.

Para cientistas políticos, a dinâmica no Senado é diferente da observada na Câmara, por isso a diferença também no alinhamento com o Palácio do Planalto. Monte lembra que senadores são eleitos para mandatos de oito anos, ao contrário dos quatro para deputado, e são escolhidos em uma eleição majoritária – assim como os chefes de Executivo.

“Eles não têm o atendimento de bases eleitorais pequenas nem são tão influenciáveis por governador ou presidente”, explica o pesquisador. Monte argumenta ainda que Eduardo Girão (Podemos) foi eleito “na onda Bolsonaro”, enquanto Tasso Jereissati (PSDB) tem posicionamentos econômicos semelhantes aos do governo federal.

“Já Cid Gomes, mesmo sendo crítico ao presidente, tem posicionamentos mais independentes quanto ao PDT. Então, ele acaba votando de acordo com cada tema”, argumenta.

A cientista política Carla Michele ressalta ainda a diferença na pressão exercida pelas bases eleitorais. “O processo parlamentar se inicia na Câmara. Acaba sendo um espaço de muita disputa e as pessoas costumam ver mais o que os deputados federais estão fazendo”, afirma. “Além disso, o tempo de mandato do deputado é mais curto. Então, tem que estar mais preocupado com a tendência do eleitorado para manter esses eleitores”, acrescenta.

Fonte: Diário do Nordeste

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