Americando

Americando: Tons paradoxais do cotidiano banal…

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“Olho de frente a cara do presente e sei
Que vou ouvir a mesma história porca
Não há motivo para festa
Ora esta eu não sei rir à toa
Fique você com a mente positiva
Que eu quero a voz ativa
Ela é que é uma boa”
(Conheço Meu Lugar, Belchior).

Um som agoniante e agudo de uma rabeca me vem à memória… como sempre esse som é agoniante… Ando sem vontade pelas ruas, instituições e tão somente a natureza com seu ar contaminado, infelizmente pelos humanos, e em plena solidão, é que um pouco de paz me abraça… só…

Vejo uma dose de uma bebida ardente em copo… seguro, olho e finto de forma concentrada o líquido amarelo que em sua composição parece ter umas ondulações semelhante ao calor, quando olhamos o final distante de uma rua… Lembro-me que vi os teus olhos em uma rua de Iguatu… os nossos olhares fixaram-se, acho que por longos 7 segundos… acho que foi na praça Caxias… tomei o líquido do copo…

O passado às vezes é mais vivo que o presente, embora seja uma roupa que não mais nos sirva, ele tem os moldes que nos tornaram assim como hoje somos… Imagino a angústia do que voltou a casa e esta não estava mais como havia deixado… De súbito o arrependimento bateu, fez o que pode, voltou… A cama, a sala, o banheiro e até a porta de entrada possuíam outro aspecto… Angústias para o coração e desassossego da mente…

Contemplei a angústia do viver a dois… Uma imposição social que não faz mal em acontecer, esta junção de dois sentimentos em comum sob o mesmo teto, contudo a imposição e expectativas sobre isto nos tornam reféns quando a inevitável frustração nos bate à porta… Vidas capengas, sentimentos reprimidos, infidelidade, palavras ao vento, reuniões familiares forçadas e todo tipo de anulação mental travestido de boa conduta e sorrisos para manter a aparência do bem que não existe na imposição…

As instituições nos humilham… nos fazem fazer um fazer que não nos pertence… somos certamente formigas que trafegam sem porquê… A modulação nas instituições é pragmática, funcional para determinado fim que quase sempre não atende ao fim daquela instituição… É um paradoxo abominável, uma peça de roupa que os súditos das instituições variadas do meio social tentam vestir e é por demais apertada… não podem nem se abaixarem que rasga logo no fundo… É cômico, totalmente patético, amador e infelizmente também trágico, melhor que fosse tão somente cômico, mas não é…

Não há saída no aeroporto, mar ou linha terrestre… É uma matrix que nos dá uma liberdade para comprar os objetos da prisão… se você tiver o vil metal, lógico… Tão pouco nos resta, tão pouco sobrou da essência, tão pouco há da natureza em meio as nossas construções urbanas destruidoras de vida selvagem… na verdade o selvagem se inverteu… digamos, destruidoras, nossas habitações humanas, de ecossistemas…

Fiz uma caminhada esses dias por algumas poucas matas que existem em nossa região… Vi animais mortos pelas queimadas, na maioria cobras, sapos, roedores e torres de fumaça no horizonte, embalagens de produtos, sacolas plásticas, garrafas pets, garrafas de vidros, sacos e mais sacos de produtos alimentícios vencidos, calçados velhos, pneus e até partes de veículos como lataria, canos de escape e tudo quanto nossa natureza consumista consome para depois sermos consumidos por aquilo que tanto buscamos… Uma angústia me invadiu… como somos nocivos a nós mesmos… fiquei entediado… mais ainda… Nesse instante em uma área próxima a uma lagoa vi um gato do mato, ou guaxinin como chamam aqui na região. Ele me olhou e bem rápido virou na direção da lagoa… Humanos possuem cheiro de morte, certamente foi isso que o fez sair tão rápido do raio de minha vista…

Por Américo Neto
Email: zeamericoneto@hotmail.com

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