Americando

AMERICANDO: Sob o clarão da lua

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Alguns sinais da minha jornada estão na sola dos meus sapatos velhos.

Já andei mundos.

Dormi no frio concreto.

Vivi sem o tempo dos relógios.

Periguei no silêncio infinito das madrugadas e ressuscitei ao amanhecer das horas.

(Maria do Socorro Pinheiro)

 

A lua estava clara…  O quintal da casa mesmo sem iluminação trazia nitidamente todos os seus espaços… A lua era a luz que afastava toda a escuridão…

Decidi dar uma volta no bairro. Era por volta de 23 horas mais ou menos, não lembro. A intensidade do clarão da lua me deixou em catarse, que reflexo maravilhoso! Fui até o portão da garagem com todas as luzes da casa desligadas, tão somente os raios de luz do satélite natural entravam pelo jardim de inverno, me deram à luz para chegar à garagem.

Saí à rua… ela estava deserta, apenas alguns gatos, latidos dos cães nos arrabaldes… Moro perto de uma rodovia, ouvia às vezes o barulho de um caminhão a passar… A iluminação pública iluminava as possíveis trevas da rua do bairro onde moro, no entanto, em alguns pontos em que o breu era presente, o reflexo lunar se tornava nítido. Existe uma área verde em frente onde moro. É um grande terreno baldio que margeia um lago. Ele é pantanoso, mas mesmo assim possui algumas veredas das quais eu dei por elas.

Pelas veredas visualizei minha sombra pelo reflexo da lula e me aproximei do lago bem na extrema da área verde e que fica atrás de algumas casas. Aqui nessa beira de lago eu já vi um lobo-guará, que se assustou em ocasião passada quando me viu.

Fui até a beira do lago. Ouvi algo como o som de uma TV ou rádio. Não deu para identificar. Tirei um charuto do bolso e um isqueiro e fiquei ali… Beira do lago, minha sombra, luz da lua, espelho d’água, coaxar dos sapos e um bom vento que levava a fumaça do charuto em suas formas ao longe…  Este lago, pensava eu no momento, está inevitavelmente condenado por nós… Eu assim como os meus semelhantes, éramos os intrusos… somos… Produzimos lixo e excrementos que a cada dia destrói a beleza e generosidade da natureza…

Eu fiquei embriagado com a beleza da luminosidade da lua naquela noite… O seu clarão me deixou extasiado e ao mesmo tempo em estado de decepção com o que fazemos, ao olhar os canos de esgoto que dão para dentro do lago…

O clarão da lua, o seu reflexo iluminando o lago, a fumaça do charuto, eu ali a pensar e ouvir a natureza original misturada à natureza humana com cheiro de morte…

Estava ali sob o luar, aquele clarão na pouca vegetação as margens do pequeno lago, o espelho d’água a refletir, eu a fumar e soltar ao ar o fumo que achava tirar a minha ânsia, fúria, angústia e esforço para significar o viver… Naquele instante um grasnar me fez sair do estado de contemplação daquilo tudo…  O clarão da lua não me fez temer, pois qualquer ser era ou seria visível ali. Lembrei-me imediatamente de meu vizinho falando que ali no “beiço” da lagoa havia um casal de carão que emitia o som que escutei.

Voltei para casa, creio que naquele instante já passava da meia-noite. Terminei o charuto, joguei a bituca no lago e me arrependi…

Que noite, lua e luar…

*Por Américo Neto
Contato: zeamericoneto@hotmail.com

 

 

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